terça-feira, 10 de março de 2015

A FUNCEME E O PAI DA COALHADA

<>O sertão se alegra com a chuva. O homem do campo comemora como se fosse a conquista de um campeonato. Desculpe, senhor doutor da Funceme mas prá nós aqui do sertão, ainda é Deus que manda inverno. E é são José que intercede por nós. E deu certo, viu? Logo em janeiro colocamos sua medalhinha numa cruz improvisada no quintal de casa.Também rezamos, joelhos no chão, à Padre Cícero e Frei Damião. Sabemos que a tecnologia(palavra esquisita para nós) utilizada pelos senhores é capaz de prever se chove ou não. Mas, por favor, não nos tire esta alegria que estamos vivendo agora, afirmando que ainda não  se pode afirmar que o inverno realmente está garantido em nosso velho Ceará. Não faça assim, doutor! Quero dizer pro Senhor que meu gado tá bebendo muita água, os burros tão comendo capim, é tudo muito gordinho. Os moleques sambudinhos aqui do nosso pé de serra são as crianças mais felizes do mundo, tomando banho nos riachos. Os gatos, cachorros, brincam feito gente. O doutor viu os relâmpagos, clareando a natureza, as pedras que abraçam Quixadá? Ouviu o ronco do trovão? O doutor pode sair um pouquinho do seu bonito carro e molhar os pés nos rios que voltaram a correr. A terra está ou não, molhada? Ouvi no programa do Jonas Sousa e também do Herley Nunes que as condições oceânicas(que diabo é isso, doutor?) poderão atrapalhar as chuvas daqui prá frente. Me desculpe, não acredito que São José nos abandone. Toda noite, tô rezando o terço da "Rádio Cultura", pedindo chuva e ela veio mesmo e não irá parar. Não ria de nossa fé. Nós do sertão, ainda rezamos, cremos num ser superior. Numa madrugada dessas deu uma chuva tão grande que mamãe passou a noite rezando: "Chagas abertas, coração ferido! Sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo, entre nós, o perigo! Escuta, tenho uma coisa a dizer, preste atenção. Este ano, a acauã nunca mais apareceu por essas bandas. Esta é a tecnologia sertaneja.  Quer saber mais? A orquestra de sapos, gias, rãs, tocam lindas canções embalando nossas vidas. O velho que toma conta do curral jura que viu com olhos que a terra há de comer, o bater da asa branca nas quebradas do sertão. E o Senhor quer acabar com esta nossa alegria, afirmando  que a chuva pode dar uma parada, não de de jeito nenhum. Faça isso não! Meus vizinhos começaram a plantar. O sertanejo está festejando! O senhor, querendo ou não, verá o milho embonecando, ficando maduro. O doutor é convidado para dividir esta alegria com a gente. O senhor jamais pense que não respeitamos o anel de homem muito estudado mas nós de mãos calejadas, vemos o sertão com um olhar diferente. Seja noite ou dia, só se fala nas chuvas. Os moradores deste pedaço do Brasil tem suas tristezas mas também tem alegria para dá e vender. Na mata, sempre se tem esperança. O senhor já sabe que o morador deste pedaço do Brasil é sempre mais feliz e que se alegra com o toque de uma sanfona, de um zabumba, de um triângulo.  E já tem morador pensando nas festas do mes de junho. O doutor já está convidado para ver São João no arraiá, comer milho assado na fogueira. As crianças do lugar já estão guardando as chuvinhas, traques. As mocinhas e os rapazes já preparam os trajes caipiras  para a brincadeira das quadrilhas. Vem ver doutor como é bonito o sertão quando chove. Tá ouvindo um canto triste ao longe? São os vaqueios da redondeza trazendo o gado de barriga cheia para os currais. Imploro, não diga que a chuva não vem mais. Agora, com licença, já é hora de dormir. Entre um pouco na nossa casa caiada, o candieiro já está aceso. Venha rezar com a gente: "Com Deus me deito, com Deus me levanto, na graça de Deus, divino Espírito Santo". Olha aí, olha aí, doutor! Tá ouvindo o "Pai da Coalhada?" (Amadeu Filho)
-Imagens retiradas da Internet