segunda-feira, 15 de junho de 2015

TIPOS POPULARES DE QUIXADÁ(11)OLHO DE BILA- ELE ESTÁ PRESENTE NA GALERIA DOS TIPOS POPULARES DE QUIXADA

Olho de Bila-foi um famoso tipo popular de Quixadá
<>Os quixadaenses sentem bastante a falta de figuras populares tão presentes nas nossas ruas, há alguns anos atrás. A calma terra dos monólitos de então, presenciava o cotidiano daquelas criaturas, de comportamento estranho, rebelde, mas sem nunca terem perdido a capacidade de amar. Sentimos a falta de Bom Legal, Zé do Saco, Pé de Lapa, Pé de Aço, Graúna, Almeidinha, Sempre Serve, Rural, Brinquedo, entre outros. Loucos ou não, não podem cair no esquecimento. Um dos grandes responsáveis pelo festival de irreverencia, estrepolias e rebeldia que se fazia presente em nossas ruas e praças, foi o Senhor José Romão, o popularíssimo Olho de Bila. Ganhou este apelido devido a uma pinta branca nos olhos.  Algumas vezes, se passava por guarda de transito e se sentia com a responsabilidade de orientar e controlar o tráfego. Certa vez, internado num hospital em Fortaleza, chamou a atenção o fato de Olho de Bila, com o objetivo de aliviar as dores dos doentes, ficar pulando de cama em cama, cantando, dançando com os cabos das vassouras. Quando recebeu alta médica, uma criança entrou numa grande crise de choro, pois não veria mais o grande palhaço. Situação presenciada pelos que o acompanharam, os amigos João Bosco e Nazion. Mostrou que, mesmo com uma deficiência, sentia um grande amor por aquelas pessoas. Foi advertido pelo médico para que abandonasse a bebida. Na presença do médico afirmou que jamais beberia daquela água. Assim que o médico saiu do consultório e, como  se estivesse num baile de carnaval, começou a cantarolar:"Só não quero que me falte a danada da cachaça". Segundo a escritora Angélica Nogueira, que mora nas proximidades da velha estação ferroviária, ele costumava, ao amanhecer, fazer discursos em alta voz, se passando pelo presidente Castelo Branco. Morvan Lobo, um dos seus amigos mais presente, nos contou que Olho de Bila tinha uma bonita voz e cantava muito bem. Zeque Roque, pessoa inesquecível, gostava de conversar com ele e se admirava de seus conhecimentos. Sabia de cór, as capitais de vários países da Europa. Quem caminhava pela praça do ferreiro, em anos anteriores, ficava bastante impressionado com os belos desenhos feitos no chão por ele, durante a madrugada. A bondosa Inacinha lhe presenteou com uma cadeira de rodas e ele a transformou num carrinho de "fórmula 1" e, pousando de Emerson Fitipaldi, disputava corrida com os carros que trafegava pela rua Tenente Cravo. Propositadamente, só andava pela contra mão. Num dia de domingo, um carro bateu na sua máquina(cadeira) e foi pedaços para todo lado.  Gostava de pegar carona nos trens de carga. Numa linda manhã, bem cedinho, subiu num dos carros e ficou acenando, dando adeus ao pessoal que se encontrava no abrigo central, próximo a estação. Fazendo caretas, gritava "adeus meus amigos!" Certa vez, foi até a estação de Senador Pompeu. Lá, ficou alojado num desses carros que ficam sem serventia. Algumas mulheres que levavam alimentos para ele, deram-lhe um indesejado banho. Daí em diante, passou a ter grande medo de água. Não quis voltar no trem e Inacinha encarregou o taxista Eílson para ir pegá-lo. Recebeu muitos rádios de presente, mas detonava-os todos e dizia que iria consertá-los. Falava que tinha aprendido o ofício com Zé Adolfo, rádio técnico de reconhecidas habilidades na terra dos monólitos.  A amputação da perna esquerda se deu pelo fato de problemas relacionado a diabetes. Começou com um pequeno ferimento e apesar dos constantes apelos de Inacinha, enfermeira que o tratava, como se da família fosse, não teve o cuidado de prevenir os riscos. Segundo os que conviveram com ele, quando ainda não tinha amputado uma das pernas, bastava um fole rasgar pela cidade, ele corria para dançar e chamava a atenção de todos. Olho de bila, muitas vezes, foi tratado como um mero objeto de nos fazer rir. Muitos deram a ele a cachaça, mas negaram-lhe solidariedade. Em diversas ocasiões, o colocavam na carroceria de um caminhão para desfiles de blocos carnavalescos, abandonando-o em seguida. Apesar de tudo isso, até de ter sido violento em algumas situações(quando o importunavam), o inesquecível Olho de Bila conseguiu conquistar o coração daqueles que o tratavam com amor. Creio que não conseguimos entender a sua necessidade de estar perto de nós. Muitos tinham medo dele, não queriam nenhuma aproximação. Felizes daqueles que enxergam essas pessoas e percebem, com sabedoria, que este mundo não gira apenas em torno de nós mesmos. Queiramos ou não, Olho de Bila e muitos outros, são universos únicos, assim como nós,  também o somos. Eles podem até ser diferentes mas humanos. Três dias depois de ser atropelado numa das ruas da cidade, veio a falecer. Era o ano de 2003. Conhecendo um pouco de sua trajetória, podemos perceber que podemos enxergar o verdadeiro significado de uma pessoa, olhando-o além de seus traços característicos. Veremos que tudo isso é apenas humano. Simplesmente e nada mais.